terça-feira, 11 de agosto de 2009

(Mario Quintana)
“Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe? O verão esta aí, haverá sol quase todos os dias, e sempre restará essa coisa chamada ‘impulso vital’. Pois é esse impulso, às vezes cruel, porque não permite que nenhuma dor insista por muito tempo, que te empurrara quem sabe para o sol, para o mar, para uma nova estrada qualquer, de repente, no meio de uma frase ou movimento, te surprienderás pensando algo assim ‘estou contente outra vez’. Ou simplesmente ‘continuo, porque já não temos idade mais para palavras grandiloqüentes como ‘sempre’ ou ‘nunca’. Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos suicídio nem cometemos gestos transloucos. Alguns, sim – nós, não. Contidamente, continuamos. E substituímos expressões fatais como ‘não resistirei’ por outras mais mansas como ‘sei que vai passar’. Esse é nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência.
Claro que no começo não terás sono ou dormirás demais. Fumarás muito, também, e talvez até se permita tomar alguns comprimidos para disfarçar a dor. Claro, no começo, pouco depois de acordar, olhando a tua volta a paisagem de todo dia, sentirás atravessada não sabe se na garganta ou no peito ou na mente - e não importa- essa coisa que chamarás com cuidado de ‘uma ausência’. Atravessarás o dia fazendo coisas como tirar a poeira de livros antigos e velhos discos, como se não houvesse nada mais importante a fazer. E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo as janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços. Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano, não são muitos, pensará com alivio.
(...)
Tão longe ficou o tempo, esse, e pensarás no tempo, naquele, e sentirás uma vontade absurda de tomar atitudes como voltar pra casa de teus avós ou de teus pais ou tomar um trem para um lugar desconhecido ou telefonar para um número qualquer ( e contar, contar, contar) ou escrever uma carta tão desesperada, mas tão desesperada que alguém se compadeça de ti e corra a te socorrer com azeitonas e champagnes, ajeitando as cobertas a tua volta e limpando o suor frio da sua testa.
Já não é tempo de desespero. Refreias quase seguro às vontades impossíveis. Depois repetes, muitas vezes, como quem masca, ruminas uma frase escrita faz algum tempo. Qualquer coisa assim:

Se as coisas são inatingíveis... ora!

Não é motivo para não querê-las...

Que tristes os caminhos, se não fora

A presença distante das estrelas

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